terça-feira, 11 de março de 2025

Pseudo-Filosofagem: Doutor Destino

Aquela vez que o Doutor Destino reconheceu sua única falha, ou... Aceitando as diferenças!

Doutor Destino é Victor Von Doom, um super vilão da Marvel, o arqui-inimigo do Quarteto Fantástico, e Monarca de um pequeno país Europeu dos Bálticos, a Latvéria. Ele é um gênio científico e um feiticeiro, filho de ciganos e o mais interessante de todos os vilões dos quadrinhos. Não digo isso porque gosto dele, eu gosto dele por isso.

Filho de ciganos, que sofriam perseguição na Europa, a mãe de Doom, Cynthia, fez um pacto com um demônio enquanto ainda grávida, para ter o poder de se livrar de seus perseguidores. Mas como preço, todas as outras crianças da vila morreram, e Cynthia foi executada por isso.

O pai de Doom era líder do clã de ciganos, porém depois disso sofreu ostracismo e a perseguição redobrou, levando-o a morrer de frio escondido nos alpes. Doom encontrou os livros de magia de sua mãe, e dominou a arte com maestria; nesse processo descobriu que a mãe estava condenada no Inferno. Em seguida se voltou para ciência, a qual também dominou com maestria, unindo com os princípios de Magia, principalmente a Robótica. Ele então atacou a todos os perseguidores, e notícias de sua genialidade viajaram o mundo. Doom recebeu uma bolsa para estudar na América, em uma escola para superdotados onde conheceu Reed Richards, o futuro Senhor Fantástico. Doom planejava criar uma máquina capaz de transportá-lo ao inferno, e resgatar sua mãe. Reed apontou erros em seus cálculos, os quais Doom ignorou; e então quando usou a máquina, tudo explodiu e seu rosto foi danificado. Ele então saiu da Universidade e passou a estudar por conta própria, como fazia antes, e culpou Richards por sua falha, jurando vingança. Ele então ouviu falar sobre um grupo de monges no Tibete com poderes lendários; Doom os procurou incessantemente. Os monges tinham uma profecia de que um dia seriam encontrados por um homem sem rosto que se tornaria mestre deles. Com os recursos financeiros dos Monges, suas invenções e Magia, Doom tomou o trono da Latvéria, sua terra natal, e virou o Doutor Destino... Insistindo no título de Doutor depois que soube que o Senhor Fantástico era chamado de Doutor Richards. A partir de então, Doom tenta conquistar o mundo.

Destino foi criado na Era de Prata dos quadrinhos, por Stan Lee e Jack Kirby. Lee e Kirby precisavam de "um super vilão sensacional que cause arrepios na alma"... Como nome escolheram "Doctor Doom" traduzido como "Destino", contudo Doom tem o significado de um juízo fatal que não pode ser evitado, de destruição ou ruína. Doom vem do inglês arcaico "dōm", do proto-germânico "dōmaz", "julgamento".

Jack Kirby modelou Doom na Morte "essa é a razão do capuz e da armadura. A Máscara lembra um esqueleto e como a Morte é sem misericórdia, ele não exibe nenhuma área de carne, porqye carne contém misericórdia". Típico do personagem é sua arrogância.

O Universo Marvel começou com o Quarteto Fantástico, em uma relação onde os vilões geralmente representam monarquia versus democracia. Nesse caso Doom é o maior dos vilões pq ele de fato, é um monarca. A história do Quarteto Fantástico envolve dois temas: Família, e Monarquia Europeia versus Democracia Americana. Os Estados Unidos foram o primeiro grande país a se revoltar contra uma Monarquia.

Doom é o espelho de Reed Richards, o Senhor Fantástico, líder do Quarteto Fantástico. Doom mostra sua arrogância mais claramente, embora também se importa mais com a família do que Reed.

Outras semelhanças incluem:

Métodos similares: Laboratórios. Isso é parte do Sonho Americano e zeitgeist de 1960: Cientistas como Magos. Doom é mestre do Ocultismo, literalmente um mago cientista.

Desejos similares: Consertar o Mundo e governá-lo. Reed Richards pode não admitir, no entanto se o Senhor Fantástico consertar nosso mundo ele certamente seria elevado a uma posição de poder inquestionável, já que todo conhecimento científico viria dele.

Ambos são incapazes de reconhecerem um intelecto superior ou semelhante. O Senhor Fantástico muitas vezes ignora que sua esposa, a Mulher Invisível, Sue Richards, tenha respostas que ele não consegue ver, incapaz de reconhecer abordagens diferentes da sua. Isso é ainda mais extremo no caso de Doom. Doom nada mais é que Reed sem Sue. Reed Richards se vê como um Líder, assim como a América, mas como Doom ele também precisa aprender humildade e reconhecer seu lugar na realidade.

Assim como o Senhor Fantástico, a vida do Doutor Destino é dominada por quatro temas:

Grandes Sonhos; Confiança; Relutância em realizar seus deveres... No caso de Doom, por muitos anos este negligenciou seu maior sucesso, a Monarquia na Latvéria, para tentar estender seu governo pelo mundo; no caso de Reed, ele negligencia a esposa e família por suas descobertas científicas. Doom é o elitismo de Reed elevado à sua conclusão natural.

Doom também serve como espelho para os outros personagens:

Ele não teve uma infância normal, etendo que agir como adulto quando ainda era criança: nisso ele é o espelho de Sue Storm, a Mulher Invisível.

Ele é imaturo em seu amor ao poder pelo poder, e o desejo de surfar nos céus com o poder cósmico: nisso se revela uma versão mais madura de Johnny Storm, o Tocha Humana.

Ele se considera desfigurado, e culpa Richards: nisso ele espelha Ben Grimm, o Coisa.

O plano inicial de Doom era conquistar o mundo, porém isso só durou até tentar todos os métodos óbvios. Então ficou claro para ele que o Quarteto Fantástico estaria sempre em seu caminho. Pior, na época (1960s) existiam muitos outros heróis, e o Universo Marvel cresceu em torno do Quarteto Fantástico. Então Doom inicia uma nova estratégia; construir uma base de poder na Latvéria, seu maior sucesso. Isso não mudou sua noção de ser "melhor que todo mundo"; então se uma oportunidade surge ele vai tentar tomar o poder, e conquistar o mundo, contudo apenas se uma oportunidade inesperada surgir. Sua principal estratégia é fortalecer sua base de poder a longo prazo.

Isso se dá porque a história de Doom é a de um homem que de fato, É melhor que todo mundo. Ele inventou uma máquina do tempo, e o Senhor Fantástico, considerado o gênio dos super-heróis, nunca conseguiu inventar uma. De fato, no Universo Marvel original, o Sr. Fantástico sempre desenvolve suas invenções a partir de tecnologia alienígena, nunca cria algo "do nada". Doom também teve contato com alienígenas, os "Ovóides" e com eles aprendeu a arte de "trocar de mentes", trocando de corpo com outras pessoas quando seu corpo físico está em perigo. Sua história é a de um homem que MERECE o Poder, mas precisa reconhecer que existem poderes maiores que ele.

Doom falhou todas as vezes que tentou enfrentar diretamente os heróis, e claramente "focar na Latvéria" é a única coisa que funciona; então passa a usar sua nobreza e título monárquico como uma arma.

Como Reed, Doom leva muitos anos para aprender sua lição. Seu lugar no mundo, e reconhecer as diferenças. Ele ainda mantém a necessidade de ser reconhecido, e ao contrário do que alguns escritores pensam, essa necessidade não é por inveja, e sim por justiça. Doom é mais inteligente que Reed, porém ainda assim Reed tem muito mais reconhecimento, simplesmente por ser americano, e servir a uma democracia.

Pensar em Doom como "um vilão" é simplificar o personagem. Sim, seu inicio se dá como um megalomaníaco, entretanto o personagem evolui para um aspecto maior e mais nobre. Na sua primeira aparição em "Fantastic Four n°5" e por anos seguidos, Doutor Destino era retratado como um megalomaníaco que queria conquistar o mundo. Todavia Destino se preocupa com seus súditos. Na fase de John Byrne, quando o Quarteto Fantástico ajudou uma revolução na Latvéria para levar a democracia, o resultado foi um país completamente devastado. Doom então disse:

"Quando Victor Von Doom governava aqui, a Latvéria era a nação mais rica e próspera de toda a Europa. Nenhum homem ou mulher estava desempregado. Nenhuma criança ia para a cama com fome. Não existia crime nem conflito".

De fato, a culpa da miséria é do Quarteto Fantástico que se aliou com rebeldes. Em nome da "liberdade".

A atitude de Doom incorpora o que os Franceses chamam de "Noblesse Oblige". É a noção de que privilégio traz responsabilidades. Como diz o Homem-Aranha, "com grande poder, vem grande responsabilidade". Doom mostra um tipo de magnanimidade que é muito similar a noblesse oblige. Literalmente Magnanimidade significa "Grande Alma".

Aristóteles descreve Magnanimidade como uma das principais virtudes e diz "Uma pessoa tem uma grande alma se ele clama muito e merece muito; aquele que clama muito sem merecer é um tolo". Noblesse Oblige vem do conceito de Platão de que aqueles em posição de poder devem ser aqueles moralmente e intelectualmente superiores.

Quando criança, Doom viu sua família e povo serem mortos e humilhados por seus governantes. Ele foi incapaz de salvá-los. Assim como o Batman: jurou a partir daquele ponto ser forte. Ele tem bons motivos para não confiar em ninguém e não permitir fraquezas. Ele sabe que quando o mundo inteiro está contra você, a menor falha pode causar um desastre. Assim como aquela pequena falha de cálculo em sua máquina causou sua cicatriz, arruinando tudo. A cicatriz é apenas um símbolo de sua mente. Tudo tem que ser perfeito e estar sob seu controle, ou é como perder toda a família de novo.

A principal razão então para Doom fazer coisas é um desejo por controle, o que requer governo, e uma crença bem fundamentada de que é a única pessoa inteligente o suficiente para administrar esse poder, e uma preocupação real por aqueles que lhe são leais, em sua vida tumultuosa. É claro, ele vê aqueles leais a ele como nós vemos nossos bichos de estimação; com amor, embora não com igualdade. Doom não vê as necessidades das pessoas como equivalentes as suas.

E, sinceramente, a crença de Doom é bem fundamentada. Ele constantemente dá provas disso; ele é um mestre do oculto e da ciência. Não é como os economistas de Faculdade que ficam falando de economia e ainda precisam pagar internet. A única pessoa no mundo que tem DIREITO de falar de economia são os membros da família Rothschild, que todas as vezes que gastam um dólar, o governo fica lhes devendo dois. O resto devia entender que ter um papel dizendo que você é esperto por ter ficado cinco anos preenchendo formulários não te faz realmente esperto.

A cicatriz de Destino tem grande parte em suas atitudes. Durante os primeiros anos, Kirby dizia que a cicatriz de Doom era pequena, e que sua vaidade é que era incapaz de suportar imperfeição: preferindo destruir alguma coisa do que ter alguma falha naquilo. Mas em FF Anual n°2, é mostrado que Doom coloca sua máscara de aço enquanto ela ainda está quente; o monge diz "mestre, ela ainda não esfriou!" e Doom responde "Dor é para homens inferiores". E nós vemos fumaça saindo de seu rosto quando  coloca a máscara, enquanto lança gritos lancinantes e corre para enterrar o rosto na neve. O ponto inteiro da história é mostrar que Doom acabou de destruir seu rosto porque isso para ele agora era trivial, não era nada. Aquela pequena cicatriz era, para ele, como se seu rosto já estivesse arruinado.

Então é claro que comete erros. No entanto desde que o mundo não os veja, tudo bem. É assim que ditadores devem agir. Então quando Reed apontou aquela falha nos cálculos o problema é que independente do resultado, aqui temos um homem que foi capaz de ver uma fraqueza em Doutor Destino. Se Reed não estivesse lá, a máquina ainda teria explodido, mas este não teria desistido: todos os cientistas enfrentam tentativa e erro, a ciência é assim. Porém desde que ninguém veja seus erros, eles não podem explorar isso. Reed viu sua fraqueza; fez Doom se sentir vulnerável e fraco. Ser fraco traz de volta a sensação de perder sua família, de ser um ninguém super dotado, mas não reconhecido.

Isso que o Senhor Fantástico fez foi uma IMENSA violação, e por isso Doom passou o resto da vida tentando superá-lo e humilhá-lo. Isso não é porque Doom tem inveja de Reed nem porque se vê como vítima; é porque ele se vê como a voz e poder da Justiça.

Note que as maiores humilhações FÍSICAS que o Doutor Destino já sofreu vieram de Ben Grimm, o Coisa. O Coisa já esmagou as suas mãos, e já lhe deu socos diretos na cara. Contudo o corpo físico é algo temporário, e agressões físicas são superáveis. Não é vergonha apanhar de um inimigo, contanto que você volte e bata nele. A vergonha vem de um cara comum ver sua verdadeira fraqueza, uma falha na única coisa que você realmente valoriza em você. Reed perfurou o ego de Destino, e por isso é seu maior inimigo; inclusive porque isso não foi feito por alguém humilde, e sim por alguém tão arrogante quanto Doom, só que diferente de Doom, não tem fundamento em sua arrogância. Lembre-se do que Aristóteles disse: "Ter grande Alma é clamar muito e merecer muito, ao contrário daquele que clama muito e merece pouco". Reed clama muito mais do que ele merece, e Doom recebe menos do que merece. Reed tem uma família que o ama, por mais que os negligencie, é considerado um super gênio enquanto que Destino, que salvou sua nação da fome, é considerado um tirano.

Aristóteles porém tinha uma tese da Unidade das Virtudes. Isso significa que quando você tem uma virtude, você SEMPRE age de acordo com aquela virtude. Isso traz dois pontos, porém. Primeiro, quando Doom parece agir imoralmente, temos que lembrar que é um homem com intelecto superior e que pode estar vendo ângulos que o homem comum é incapaz de ver. E segundo, isso não significa que a pessoa não possa cometer erros. Esse é realmente o único ponto falho em Doom. Aristóteles e Tomás de Aquino erraram nesse ponto da Unidade das Virtudes, quando asseguraram que uma pessoa virtuosa não comete mais erros. Isso seria verdade apenas em uma pessoa livre de todas as influências físicas. Seria como dizer que Doom só seria um gênio se nunca cometesse um erro. Contudo é muito claro que Destino é um gênio e que comete erros, e isso não diminui sua genialidade. Gênios podem cometer erros, apesar que menos que o cidadão comum. Então Platão está correto. Mesmo em um homem virtuoso, enquanto estiver em um corpo físico, algumas vezes as partes inferiores da alma podem se sobrepor às partes superiores, onde a virtude está. Por isso, para Platão, a Virtude não apenas deve ser obtida, mas mantê-la é uma questão de constante vigilância.

Em todas as realidades alternativas da Marvel, o único mundo perfeito é aquele onde Doom governa. O único preço é o livre arbítrio, e se referir ao julgamento de Doom em todas as coisas.

Doom acredita que o preço da prosperidade é baixo. "Tudo que eu tiro do povo é uma única liberdade... A liberdade de cometer o mal". Na mente de Doom isso faz sentido, ele sabe melhor que todos. Mas é um pouco simplista. A liberdade de cometer o mal só pode ser removida se observarmos as ações de todas as pessoas e forçarmos um padrão inquestionável de comportamento. Significa sacrificar várias liberdades, incluindo privacidade e a habilidade de discordar de Doom. Alguém pode dizer que Doom é paternalista, e que paternalismo é maligno, mas pense nisso...

VIVEMOS EM UM MUNDO ONDE VOCÊ TEM QUE MANDAR AS PESSOAS USAREM CINTO DE SEGURANÇA.

Todos os dias, um bando de inconsequentes que se julgam boas pessoas, dirigem bêbadas ou sem cinto de segurança pondo em risco a si mesmos, seus filhos, e as famílias dos outros. É como se um bebê tivesse os mesmos direitos e liberdades que um adulto responsável, e os bebês são MAIORIA. E entre estes, os piores são os que pensam que são adultos, e passam a vida discutindo superficialmente os "métodos", "dialética", "epistemologia" e outros conceitos floreados sobre o que as pessoas dizem, ao invés de ver se o que a pessoa disse FUNCIONA de fato, na prática. Eu sinceramente tenho mais respeito por aquelas pessoas que reconhecem e agem dentro de sua própria natureza. Esses eu consigo ver como mentes diferentes, enquanto os outros são simplesmente desperdício; nem sabem ser eles mesmos, nem sabem ser outra coisa. Por esse motivo usam de um floreado forçado, como uma caipira querendo se passar por socialite usando maquiagem caríssima, porém com a cara toda borrada enquanto o milionário descansa de havaianas.

O problema do Doutor Destino não é ele querer tirar o livre arbítrio da população, que nem usa mesmo. O pior problema do Doutor Destino é o mesmo de Reed Richards, o Senhor Fantástico, reconhecer perspectivas DIFERENTES de vida, e que existem poderes superiores a ele.

Isso nos leva a dois pontos altos na trajetória do Doutor Destino: O primeiro, quando conseguiu roubar os poderes cósmicos do Surfista Prateado.

No final dos anos 60, a Marvel precisava de um novo vilão, um que fosse além das considerações convencionais de bem e mal. Kirby então pensou "e se o Quarteto Fantástico enfrentasse Deus?". Então ele criou Galactus. Galactus é um ser primordial, abstrato, que devora planetas para sobreviver. Ele é de um universo anterior ao nosso, e sua função é manter o equilíbrio no cosmos. Em um ponto de sua história, Galactus adota um arauto, o Surfista Prateado, imbuído de Poder Cósmico, para que se aproxime de planetas habitados e avise aos habitantes que Galactus está se aproximando, e irá devorar seu planeta. No fim da história, o Quarteto Fantástico consegue conquistar o respeito de Galactus, e provar que a raça humana merece continuar existindo. Impressionado, o Surfista Prateado decide ficar na Terra, para conhecer melhor a humanidade.

Então o Doutor Destino vê uma boa oportunidade para roubar o incrível poder cósmico que Galactus concedeu ao Surfista. Destino diz que "Poder sempre foi meu Deus". E ele consegue. Ele atrai o ingênuo Surfista Prateado e com uma máquina consegue drenar todo o poder cósmico para si. "O mundo agora pertence a DESTINO!".

O Surfista Prateado era tranquilo, sábio, digno, e calmo. É um dos seres mais poderosos do Universo Marvel, porém ele nunca proclamou seu poder e glória do modo que Destino fez assim que conseguiu esse poder. O Surfista SERVIA a um poder maior. Destino queria ser servido. Assim que roubou o poder do Surfista, Destino diz ao Surfista: "Agora, sou eu quem possui o Poder Cósmico! Nunca antes um ser humano foi tão supremo... Tão invencivelmente superior... Quanto eu! Agora que a humanidade contemple que Doutor Destino possui poderes suficientes para desafiar o próprio Galactus!".

Ao contrário do ditado "O Poder tende a corromper, e Poder Absoluto tende a corromper absolutamente", vemos que não é o poder em si que é corruptor; é o recipiente que recebe este poder. Se uma pessoa já tem falhas de caráter que o inclinam para a corrupção, então a menos que domine estas falhas, a queda é inevitável.

Doutor Destino claramente vê que o poder e glória são seu direito... E está certo. Também vê que é perfeitamente permissível alcançar seus fins ao custo por métodos questionáveis, vendo os outros como meros meios para um fim, ou obstáculos para serem eliminados. No entanto aqui vemos a falha mortal em Destino.

Assim que o Doutor sai voando com seus recém adquiridos poderes cósmicos, o Surfista Prateado fala como um verdadeiro Filósofo Estoico: "Apesar de ter perdido meu poder... Eu não rastejo! Eu não me humilho! Eu não lamento! Eu ainda sou o Surfista Prateado!"

Ou seja, o recipiente ainda é o mesmo, quer contenha poder ou não. Um indivíduo que não é corrompido pela aquisição de poder não é destruído pela perda deste. Ele é confortado em saber seu lugar no Universo, com ou sem poder. O Surfista ainda profetiza: "Apesar que Destino possui poder agora, esse poder é usurpado! De algum modo, tão certo quanto o cosmos permanece, isso irá... Isso deve... Destruí-lo!"

Esse é um ponto CENTRAL da Filosofia Clássica. O conceito de que assim como as leis físicas como a da gravidade, a Ordem e Justiça também faz parte da fundamentação do Universo. Uma pessoa que não é capaz de lidar com o poder que recebe, especialmente de forma anti-ética, caminhará para a autodestruição. O problema do Poder é o mesmo do Dinheiro: Ter isso não é problema, o problema é que tipo de pessoa tem.

O Surfista Prateado era o ser mais poderoso a surgir na Terra, contudo obedece a uma deidade Superior, Galactus. Ele reconhece uma hierarquia cósmica. Destino não reconhece. E é exatamente isso que o derrota. Quando tenta sair do planeta Terra, Destino não sabia que Galactus tinha colocado uma barreira em volta da Terra, para manter o Surfista Prateado em exílio terrestre. Assim que tentou atravessar a barreira, Destino perdeu todos os poderes, que voltaram para Galactus.

A grande ironia em Destino ser incapaz de reconhecer poderes superiores é que é um mestre do Ocultismo e Ocultismo envolve precisamente isso: Seguir poderes superiores. Destino é claro se vê como usando esses poderes, mas a realidade seria bem diferente. Poderes superiores são todos interligados: O conceito fictício de Galactus seria na vida real o conceito cósmico de Entropia. E quando alguém alcança Apotheosis, se funde com o infinito, a pessoa se torna um conceito abstrato. Abraçando isso Destino alcançaria o que finalmente quer, poder absoluto, um mundo perfeito, e união. Entretanto acaba impedido por sua incapacidade de reconhecer seres superiores a ele, pelo menos nesse ponto de sua história. Isso é fortalecido pelo fato de que conseguiu enganar o Demônio; em uma aventura com o Doutor Estranho, o feiticeiro supremo da Marvel, os dois vão até o Inferno resgatar a mãe de Destino. Vendo que seria incapaz de fazer isso, Destino trai o Doutor Estranho para o demônio. A mãe de Destino fica horrorizada pelo ato do filho, e o renega. Ao realizar esse ato, de renegar o próprio filho por um ato imoral dele e ter piedade do Doutor Estranho, a mãe alcança a redenção e é salva do Inferno, e vai para o Paraíso. Acontece que foi tudo planejado pelo Doutor Destino... Ele salva o Doutor Estranho e explica que ao custo do amor da própria mãe, conseguiu salvá-la. Ele venceu o diabo em seu próprio jogo. Um homem assim dificilmente reconheceria seres espirituais como seus superiores.

Ele e o Senhor Fantástico possuem o mesmo problema, embora Destino ainda tem vantagem. Ele reconhece Magia, enquanto que o Senhor Fantástico é incapaz de compreender algo acima das leis da ciência. Nenhum dos dois aceitam críticas, e Reed acredita que o desejo de Ben Grimm por lutar e o de Sue em ser gentil são sinais de mentes limitadas, ao invés de mentes diferentes. A grande chave para o Doutor Destino e o Senhor Fantástico está em aprenderem a aceitarem as diferenças.

Isso aconteceu com Destino.

Em um certo ponto, o Doutor Destino conhece outro inimigo do Quarteto Fantástico, Kang, o Conquistador. Kang é um conquistador intergalático do século XXXI, que decide viajar para 1966 para enfrentar os super-heróis no início da Era dos Heróis, porque na sua época, não existem mais realizações a serem alcançadas. E Kang então revela que é descendente de Doom.

Aqui, a partir desse ponto, começa a suprema confiança do Doutor Destino, e ele perde parte do complexo de inferioridade que Reed lhe imputou no dia que conseguiu sua cicatriz e que faz com que necessite tanto de reconhecimento. Porque a partir desse ponto, sabe que não será derrotado no futuro... Kang é seu descendente. Então adquire a confiança de que ninguém está acima dele, e que no final, Destino vencerá. Paradoxalmente, ter a confirmação de que é superior ao Senhor Fantástico permite que Doom tenha a abertura de reconhecer qualidades em outras pessoas.

"Pessoas superiores não têm problema em reconhecer as qualidades de outras e verem o melhor nelas, porque isso não as ameaça mais."

Ele enfim reconhece isso na Saga "Imperador Destino".

"Imperador Destino" foi a primeira "graphic novel" da Marvel, e considerada uma das mais importantes. Ela apresenta um desenvolvimento explícito no personagem Doutor Destino. Nessa história, Destino obtém um fio de cabelo do Homem Púrpura, um ser cuja mera presença exerce controle mental sobre outras pessoas. Apenas Destino é capaz de resistir por mera força de vontade. Destino consegue evitar o Quarteto Fantástico, desenvolver seus planos em segredo e por fim conquistar o mundo. Ele controla todos os seres humanos e apenas torna o mundo um lugar melhor. Eliminando totalmente o livre arbítrio das pessoas.

Inevitavelmente, um herói escapa da influência de Destino, liberta os outros, e Destino é derrotado. Mas isso só acontece porque assim o permitiu. Ele cansou de governar o mundo, e mais ainda, percebeu que não há mérito em governar o mundo se ninguém é capaz de reconhecer isso. Então descobre a função do livre arbítrio, para que as pessoas possam legitimamente reconhecer o mérito do Doutor Destino. Ele percebe que o único lugar onde isso aconteceu foi a Latvéria, e que finalmente seu papel na hierarquia da criação não é governar o mundo, mas governar a Latvéria, seu povo. Apenas lá possui genuíno respeito. Latvéria é seu lar natural, onde a população genuinamente o ama.

Depois de uma imensa saga na qual o Universo Marvel literalmente ACABOU, as Guerras Secretas de 2015, o Doutor Destino vira um Deus. Porém não corrige seu rosto. Ele reúne um pedaço de cada realidade que existia em uma única realidade, casa com a mulher do Senhor Fantástico e toma os filhos dele para si. O problema é que o Senhor Fantástico sobreviveu, e o destino final do Universo é uma luta entre os dois.

Nesse ponto, os personagens alcançam seu desenvolvimento final, e salvação.

Destino admite que sua necessidade por controle vem de uma grande insegurança, e por isso segura as coisas tão firmemente que não há espaço para nada mais crescer. Ao invés de criar um novo Universo, ele se apegou aos restos do antigo, em uma existência estagnada. Ele reconhece que Reed teria feito melhor, teria desenvolvido este mundo naturalmente, e que seu dever é com seu povo. E Reed reconhece que sua função é ser um pai de família. Ele então passa o poder para Reed. Reed refaz o Universo, se retira com sua família para um nível superior de existência onde observarão o desenvolvimento do Universo, mas antes, ele refaz o rosto de Doom.

Doom volta para a Latvéria, dessa vez com o rosto recuperado, retira a máscara, e sorri. Qual seria o futuro natural do personagem? Ele já mostrou que não se incomoda de viver através de outras pessoas, seja trocando o corpo, ou através de descendentes. Com parte de sua consciência permanentemente ancorada neste mundo, ele é livre para reconhecer uma existência superior e seres superiores, e então finalmente ter uma família, e talvez um dia rever sua mãe.

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